domingo, 11 de janeiro de 2009

Seus cabelos escuros contrastavam com sua pele clara e esbranquiçada. Sua postura era sempre arrogante e imponente, por mais que, às vezes, não quisesse parecer desta forma. Possuía um rosto bonito com traços fortes, olhar profundo, boca farta e pálida.

Eu a achava linda, me perdia inúmeras vezes contemplando a sua beleza demasiadamente confusa. O modo como piscava, falava e se movimentava, todos os seus gestos pareciam ser pré-estudados e planejados. Movimentos estes que evidenciavam a delicadeza na qual ela tanto teimava em esconder.

Raramente sorria, era discreta. Chegava tímida e aos poucos tomava a atenção das outras pessoas, ora por sua excentricidade, ora por sua ousadia. Era charmosa sem se tornar vulgar, era requintada e complexa, mas ao mesmo tempo simples e pobre. Gostava de cores quentes e vivas, apreciava os gostos fortes, as bebidas, os temperos e os tabacos.

Para os que não a conheciam transmitia uma imagem frívola, descrente e desapegada, porém bastava um pouco de aproximação para sentir a profunda intensidade de seus sentimentos, jamais superficiais, ardia com suas paixões e, por conseqüência, com seus ódios também.

Lutava internamente pelo equilíbrio, por cansar de si mesma muitas vezes, cansar de seus sentimentos extremados. Acreditava em alguma força divina superior, embora a descrença, às vezes, lhe batesse a porta, porém sua fé e necessidade vital de crer em algo maior permitiam que rapidamente retornasse as suas crenças anteriores. Apegava-se com facilidade às coisas, mais ainda às pessoas, existia muita raiva dentro dela, muito desespero.

Escondia-se atrás de uma maquiagem pesada, cabelos ondulados, unhas avermelhadas. Por ironia do destino, filha única. Além de todos os seus demônios, carregava consigo o peso e a culpa de ser única, exclusiva, amada e não se sentir digna de tal profecia, por ser egoísta e cruel, uma dama. Seus mistérios, os quais nunca conseguirei descrever em totalidade, me encantavam e muitas vezes flagrei-me perguntando a Deus o que Ele planejou ao colocar aquela doce flor delicada em minha vida, na verdade, em nossas vidas.

O que me doía, ainda me lembro, era a sua visível infelicidade. Sua inadaptação e sua luta constante contra si mesma. Não se acreditava merecedora da felicidade, ou digna de qualquer bem estar, de qualquer afeto. No seu íntimo, ela se sentia um verme perto de todos os outros, seu maior erro era comparar-se.

Com sua ingenuidade observava outros rostos satisfeitos e sorridentes, enquanto ela chorava por dentro tentando entender seus demônios internos. Era insegura, mas não havia motivos para ser. Não se amava. Destruía-se lentamente toda vez que encostava algum copo de cristal fino em seus lábios, entorpecia-se. Suicidava-se toda vez que, com sua piteira, tragava o mais forte dos cigarros. Baforava lentamente a fumaça escura, e aquele gesto me dava arrepios, pois depois procurava alguém que a estivesse observando e, como ela mesma previa, sempre haveria alguém extasiado por sua quase perfeição de existir.